quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

É sempre amor


Ela nunca entendia o porquê das pessoas ainda a tratarem com carinho depois de tudo o que ela deixou de fazer, não entendia os abraços ou sorrisos que vinham sempre, mesmo que sua resposta, na maioria das vezes, deixasse os olhos dos que tentavam cheios de lágrimas, não era assim que ela queria ser, ela nunca teve a chance, mesmo que breve, de escolher. Talvez, apenas talvez, ela só espalhasse solidão, por esse ser o único sentimento que ela conhecia bem.

Mas um dia algo aconteceu algo começou a bater de forma diferente, seus átrios e ventrículos pareciam não ter mais nenhum controle da situação e seu músculo estriado cardíaco que estava lá apenas para que ela continuasse, em teoria, a ser humana; e foi ai que seu coração bateu, bateu por alguém, essa era a situação mais estranha que seu corpo vivera desde sempre.

Seus neurotransmissores não conheciam a mensagem que enviavam para o resto do corpo, parecia um erro de sinapse, parecia que a adrenalina tinha se misturado com endorfinas apaixonadas no caminho, mas ao que tudo indicava, ela estava definitivamente apaixonada.

Acabou



É isso, uma guerra perdida, um caminho trilhado no meio do nada dando a lugar nenhum, perdida no meio de todos, perdida dela mesma, de tudo o que acreditava, terrivelmente sozinha. As coisas pareciam se mover mais rápido para aqueles olhos que viam o mundo com cores diferentes dos outros, e não eram só as cores, ela deveria ser a única na cidade a acreditar que amor é alguma coisa que exista para todos.

Das amigas sempre a mais careta, das namoradas sempre a mais letrada, das inimigas sempre a mais perigosa, das alunas sempre a mais rebelde dos gostos sempre a mais estranha, gostava de um pouco de tudo, e às vezes odiava ter de ouvir a própria voz. Das pessoas uma das mais estranhas, não gostava de ganhar flores, como se demonstra amor dando algo que esta morrendo?! Ela sempre se perguntava isso.

Não lidava bem nem com elogios e muito menos com agradecimentos, ela sempre foi tida como a mais forte, mas manter isso lhe causava mais fios brancos, não que ela fosse velha, ela seria até jovem, vendo pelos padrões de hoje, mas ela era assim: Diferente da maioria das pessoas, ela gostava disso, de ser assim, de não ser o que todos poderiam pensar e ainda assim cativar umas poucas pessoas a quais defendia com uma língua afiada e nada mais, e acredite isso bastava pra acabar com a maioria dos seus inimigos.

Mas um dia, não mais que de repente, ela foi pega por uma daquelas coisas que chamam de “armadilhas do destino” e se apaixonou pela primeira vez, mas o problema foi que ela se apaixonou sozinha, e foi assim que ela viveu por longos dias, meses…Foi assim que ela achava que vivia, ela deixou tanta coisa pra traz, e dentre uma dessas coisas estava um texto que dizia “eu nunca vou mudar o meu jeito de ser”, quando ela percebeu era tarde, mas não era tarde demais, ela voltou atrás, é claro que nem tudo voltou a ser como era antes, e ela nem sabe ao certo o que seria aquele sentimento estranho que tomou conta de seu corpo, eu já disse que ela era diferente?!

E então ela sumiu, deixou suas cordas de marionete e foi viver, e isso tudo aconteceu enquanto ela sonhava, porque ela continuava lá, mas sua atitude era nova, ela era nova, e o novo é assim, te pega de surpresa e te faz ver o que antes você achava imposível.Ela continua vagando por ai, em uma dessas estradas do viver ,daquelas cheias de curvas e placas do tipo é proibido parar, além das que dizem, cuidado, vacas na pista Ela já vagou muito e no dia em que viu uma placa em branco parou pela primeira vez e escreveu “perigo, um dia você pode ferir seu coração”e a placa seguinte era: É proibido parar.

Você também vai envelhecer


Sabedoria, experiência; são algumas das palavras que vem a nossa mente quando pensamos em idosos, mas nesse mundo tão complicado em que nós nos metemos parece que nem todos pensam assim.

Cada dia mais, os idosos são discriminados, ofendidos e deixados de lado em grande parte dos lares. De um dia para outro alguém que tinha tanto a ensinar ficou obsoleto, velho, os seres humanos, em geral, são engraçados, eles nunca gostam de ver o futuro, por isso deixam as pessoas que amam de lado pelo simples fato delas terem ficado velhas. Esquecem que aquele ser experiente antes recebia outro nome; tio, avó, pai, mãe… E era sinônimo de amor.

Foi necessário até criar o estatuto do idoso, para garantir que os direitos dos mais velhos fossem respeitados de forma digna, foram necessárias leis para os filhos aprenderem como tratar os próprios pais. Leis que asseguram o que todos os seres humanos deveriam ter; casa, comida, direitos respeitados, mas não existe obrigatoriedade de uma das coisas mais importantes para a sobrevivência humana: O amor, os idosos, assim como todo e qualquer ser humano precisam de amor.

Um dia, veremos nosso passado com olhos fundos e rugas por todos os lados, um dia iremos desaprender como andar sozinhos na rua e diremos que no nosso tempo tudo era bem mais fácil, um dia vamos nos reunir para contar dos nossos velhos tempos, teremos filhos, netos e até mais, porque um dia todos vão envelhecer.

Menina


Ela anda meio distante, meio perdida, meio sem tempo, meio sem vida, meio apagada. Ela não era assim, nunca foi. Isso aconteceu de uns tempos pra cá. Sempre muito convicta de suas ações era praticamente impossível surpreender aquele ser humano que andava só, igualmente impossível era prever suas reações, normalmente ela era fria demais, calculista talvez, uma vez perguntaram se ela era feliz, a resposta incluía uma fórmula de um composto químico e duas linhas de palavras ácidas, ela era assim mesmo, sempre foi, contentamento não era sua palavra favorita.

Como um ritual diário, depois de acordar, a menina tateava pela casa e achava uma caixinha de mármore, que ficava ainda mais fria nas manhãs ensolaradas, e discretamente olhava para dentro da caixa fria e sorria, era a única demonstração de afeto que ela se deixava executar, por vezes ficava admirando o conteúdo da caixa, por vezes, sonhava em tirar e dar o motivo de sua alegria para alguém, mas ela queria fazer isso no tempo certo e, principalmente, para a pessoa certa.

Mas assim como as estações do ano, ela mudou, deixou a amargura de lado e foi viver pela primeira vez, ela foi vista agindo como gente e não como um ser humano, ela sorriu, criou laços e até desafetos, deixou a vida do mais ou menos e partiu em busca de aventura.

Ela tinha se esquecido do conteúdo da caixa, a vida parecia correr mais rápido do que seus pés, mas um dia alguém lhe fez lembrar. Então ao chegar à casa a menina retirou o seu bem mais valioso da caixa, retirou com todo cuidado, e da maneira mais verdadeira possível deu aquilo, que para ela era tão importante para alguém que ela achava especial.

Contrariando todos os contos de fada, o alguém lhe pediu desculpas e disse que não poderia aceitar o seu presente, a menina que agora lutava contra suas lágrimas, que caiam em um pranto silencioso, quente e ao mesmo tempo salgado chegou a casa, pisando de leve no chão para não acordar seus sonhos, abriu a caixinha colocou o presente rejeitado, com lágrimas nos olhos, e fechou. Aquele objeto se chamava amor, e era o melhor sentimento que ela poderia oferecer. Hoje ela anda entre nós, sem destaque, sem glórias, com um sorriso discreto e olhos úmidos, olhos de alguém que viu o mar pela primeira vez e quase se afogou. Se eu puder lhe dar uma dica, seria: Nunca pergunte para ela por onde anda a tal caixa ou se alguém algum dia verá novamente o seu conteúdo, mas quanto a ela ser feliz, pode perguntar a resposta será simples e harmônica: Sim.

Pássaros


Era o começo do mais rigoroso inverno visto por aquelas bandas, todos os animais que pretendiam sobreviver já tinham ido embora, abandonado ninhos, tocas e grutas. Mas ele não, ele não podia ir sozinho, e desde que sua companheira quebrou a asa esquerda ele decidiu que só iria se fosse com ela. O pobre passarinho não tinha muitas alternativas: Ou ficava ali e fadava seu destino à morte ou abandonava aquele amor tão grande que sentia para voar sozinho.

A decisão lhe tirava o sono, ela estava muito fraca e não aguentaria voar por tanto tempo, os seus olhos perdiam o brilho sempre que via as folhas das arvores caírem, parecia que ela sabia o que iria acontecer, mas ele não, ele tinha que bolar um plano, a vida não poderia ser tão injusta, porque um pássaro? Porque eu sou algo tão frágil? Ele se indagava a todo o momento e pensava: Se eu fosse mais forte, se eu não tivesse pedido para que ela fosse voar comigo aquele dia, ela não estaria assim eu fiz isso, e ela, em troca, só me deu o sentimento mais puro que esse mundo pode conhecer.

Os dias foram passando e o inverno ficou cada vez mais insuportável até que ele virou para sua companheira e com olhos que cintilavam cores diferentes disse: Você vai comigo, bolei um plano diferente nós vamos demorar o tempo que acharmos necessário, pararemos nas arvores mais bonitas e comeremos os frutos mais doces…

Ela o olhou com olhos tristes encostou o bico em seu ombro e disse: Nunca espere demais para decidir ser feliz, eu te amo meu querido, mas essa viagem você fará sozinho, ele sentiu suas penas se esfriarem, a deitou em seu ninho e voou, sem pressa para o destino que não conhecia, decidiu acatar o ultimo desejo de seu único amor e ser feliz.

Todos os anos seguintes foram de alegria, uma alegria solitária para o passarinho, uma alegria que só era alegre pela lembrança de seu amor, ele sempre voltava ao ninho onde havia passado o tempo mais encantador de sua vida, olhava e pensava: O tempo é algo tão cruel, a vida é tão bonita, mas sem o amor a vida é um relógio em contagem regressiva.

Pra ver se cola


Já era noite, quando uma garotinha esbaforida bateu na porta do senhor Aristóteles pedindo de ele abrisse a loja o mais rápido possível, ele pensou em fechar a porta na cara dela ou fingir que nem escutava o que a menina dizia, mas ao notar os soluços, que iam e vinham, ele decidiu fazer a vontade da menina.

Ele foi à frente, ela pouco atrás, cambaleava um pouco, porque estava sempre olhando para baixo. Seus olhos estavam vazios, não existiam lágrimas, nem dor, nem amor, para dizer a verdade, nem cor existia neles.

Ele chegou, abriu a loja e colocou-se atrás do balcão. Esperando o pedido do produto que o tirou de casa em um domingo as 10 da noite. Ela finalmente olhou para ele e com uma voz quase que sussurrada disse:

-Me veja a cola mais forte que tiver não se preocupe com o preço, eu quebrei meu porquinho e tenho o suficiente.

Ele achou estranho tal pedido e perguntou porque ela precisava tanto assim de uma cola resistente.Colocou a melhor cola por cima do balcão.

A menina, já com as mãos na cola, disse em voz baixa:

-É que eu preciso muito dela para colar algo que eu tinha e que dei pra alguém que não merecia; então agora ele está quebrado e eu sinto muito a falta dele.

Senhor Aristóteles deu uma gargalhada e disse:

-Calma menina, traga o brinquedo aqui e eu mesmo colo para você, não precisava me tirar da cama, eu vou arrumar o seu brinquedo, não se preocupe…

Ela o interrompeu em um tom triste:

-Não… ninguém quebrou nenhum brinquedo meu…

-Então o que é? O que está quebrado? O senhor Aristóteles não poderia imaginar o que deixaria aquela garotinha tão chateada

Ela largou suas moedas no balcão, chegou perto da porta e disse baixinho:

-Eu preciso de alguma coisa para colar o meu coração, eu o dei para alguém que o deixou em pedaços e só vim aqui, tão longe, para ver se ele volta a ser o mesmo.

O senhor Aristóteles que agora estava contendo as lágrimas que vinham, tentou olhar na direção da menina, mas quando conseguiu levantar a cabeça ela já tinha ido embora.

(des)conhecidos


Ela nunca foi muito ligada em nada, largava tudo por fazer, deveria ser mania de quem não quer crescer, não conseguia ter amizades longas e até o cabelo mudava mais do que deveria, um dia ela estava sentada numa festa, achando todo mundo meio estranho, meio chato, meio de mentira, até que um garoto sentou ao seu lado, pegou sua câmera e lhe mostrou uma foto, dizendo:

-Lembra desse dia?

Ela ficou olhando para aquela foto, e não conseguia saber o motivo que a faria lembrar, ela estava bem ao fundo, uma penetra, alguém que passou na hora errada. Então, pegou a câmera, aproximou a foto para ver o seu rosto e disse:

-Eu não vi sendo tirada, me desculpe por atrapalhar a sua foto, mas nem foi tanto assim, eu estou sorrindo, isso raramente acontece pelo menos essa é uma prova de que eu não estava tão perdida quanto eu achava.

Ele sorriu, olhou para baixo e continuou

-Eu nunca disse que você atrapalhou, eu só perguntei se você se lembrava para ter um assunto, você nunca iria se lembrar de alguém como eu e nem ficaria sabendo que é pra essa foto que eu fico olhando antes pegar no sono.

Ela, que agora sustentava um olhar tão doce, tão verdadeiro, olhou bem nos olhos do estranho, lhe devolveu a câmera e disse:

-Isso que é engraçado na vida, por isso eu gosto tanto de fotos, assim você consegue parar alguém, um estranho, e você, nem que seja por um momento, faz parte da vida de alguém.

Os dois se olharam por longos minutos, os olhos se cruzavam diversas vezes, até que disseram, ao mesmo tempo.

-E você, quer fazer parte da minha vida?


Era mais uma noite, e como em todas as outras lá estava ela, sentada calmamente na varanda, olhando e admirando o céu. Até ai nada demais, era comum para garotas jovens ficar admirando as estrelas, mas com ela era diferente, ela conversava com uma delas, compartilhava os seus sonhos, medos e sabia que ela a entendia, mesmo que parada no mesmo lugar, brilhando sempre mais do que ela poderia esperar de qualquer luz, a estrela parecia tentar se comunicar com a menina, mas ela era esguia demais, parecia ter medo de manter alguma relação verdadeira com a garota, e quando se decidia já era tarde e a menina tinha ido se deitar.

E vários encontros aconteceram, até chegar ao dia em que a garota, que estava sentada no mesmo lugar, não viu a sua estrela, ela estava decidida a não sair, suas pálpebras quase fechadas se abriram ao ver uma estrela cadente,então ela apertou os olhos, respirou fundo e pediu a melhor coisa do mundo, quando os abriu novamente a estrela já tinha desaparecido.

Ela, que agora olhava apenas para os próprios pés, acabou esbarrando em uma linda criatura branca, com bochechas rosadas e olhos mais brilhantes do que esperaria de qualquer luz, a criatura, que parecia tão fascinada quanto ela indagou:

-O que fazes aqui sozinha, olhando para o chão?

A menina, que agora tentava disfarçar o constrangimento lhe disse:

-Eu não estava sozinha, uma estrela estava comigo, mas ela caiu….

-Uma estrela cadente? Os olhos da criatura brilhavam ainda mais

-Sim….Uma estrela cadente. A menina realmente não via o fascínio que uma estrela cadente poderia causar

-E qual pedido você fez a ela? Poderias me dizer? E ele foi se aproximando cada vez mais.

-Eu pedi a melhor coisa do mundo, mas não sei se ela entendeu…Agora os olhos dela estavam cada vez mais presos aos dele

-E, para você, qual seria a melhor coisa do mundo? Ele não pararia até receber uma resposta

-O amor, eu queria um amor, mas não um amor qualquer eu queria um amor…

Ele levantou seus cabelos, olhou bem no seu rosto e disse a palavra com a qual ela sempre sonhara ouvir

-Incondicional.

-Isso, como você sabe?

-Porque eu sou a sua estrela.


Infinito


“Eu sei que estive ausente, sei também que é esse o motivo de não ter respondido as outras cartas que te mandei, mas entenda que eu precisava de um tempo, eu precisava de um tempo só pra mim, sabia que eu até parei de roer as unhas? É, esse sem dúvidas é um dos piores pedidos de desculpa já feitos, mas entenda que você sempre foi intensa demais para mim, sempre tão verdadeira que eu não pude suportar, aos poucos eu fui me sentindo inferior a você, e acho que é esse o motivo da minha partida.

E eu sei que estava errado em não me despedir, sei também que eu devo ter partido o seu coração, mas a vida tem dessas coisas mesmo, e eu queria dizer que sinto a sua falta, estou indo em breve fazer uma visita, não direi quando nem onde estarei.

Ainda te amo muito, com todo o amor do mundo…Murilo”

Poderia ser uma carta qualquer, mas não era, a resposta veio em seguida, Murilo mal conseguia conter o brilho nos seus olhos e assim que pegou o envelope o abriu bruscamente e começou a ler a carta tão esperada

“Murilo, quem te escreve é a Marina, lembra de mim? Amiga da Érica, você está há tanto tempo fora que nem deve ter escutado, a Érica se suicidou, já faz uns 3 meses, é eu também me pergunto o que faria uma garota tão linda cometer essa brutalidade com um corpo tão frágil, você sabe que eu nunca fui boa com as palavras, ao contrario dela, e agora, nessa carta, eu realizo o único pedido que ela me fez, vou te mandar a carta que ela escreveu para você.”

Murilo, calma, não tente nada errado, a culpa não foi sua, eu sei que pode soar estranho o que eu vou te dizer, mas já que eu sou mesmo estranha apenas por estar escrevendo essa carta, eu quero dizer que você foi e é uma das coisas mais importantes pra mim, e mesmo que você nunca tenha se despedido, eu sei que era a única forma de ir.

Eu só não entendo porque você nunca tentou me explicar, as coisas ficaram confusas depois que você se foi, sabia? Parece que ninguém me entende e que tudo está nas minhas costas, as brigas aqui em casa estão cada dia mais freqüentes e eu queria você aqui, eu preciso de você sabia? Eu sei que sou intensa e que isso pode nem ser tão grande assim, mas parece que o mundo está caindo, e eu nem chego a ter como lutar, queria você aqui, queria você aqui.

Eu sei que você é contra alguém tirar a própria vida, mas você fez isso quando me deixou, eu apenas estou excluindo o corpo material que ficou depois que a minha alma morreu.

Sobre se encontrar


Era como se ela não estivesse ali, o mundo passava por ela de forma dramática, todas as ações dos outros pareciam drásticas demais, e ela se perguntava: Como os seres humanos conseguem viver em paz com tudo isso? A resposta era simples e ela mesma sabia: A maioria não viva em paz.

Todo dia ela ia até a praça da cidade, limpava o pequeno banco azul e se sentava, bem atrás de um arbusto e conseguia o que chamava de “capa da invisibilidade”.

Após um mês de observações ela constatou algumas coisas sobre as pessoas:

Primeira coisa:A maioria das pessoas espera uma falsa humildade dos demais; ela notou isso quando viu um garoto chegar com sua redação para mostrar aos amigos, quando viram o seu dez ficaram logo contentes e perguntaram-no como o conseguiu, o garoto olhou bem para eles e disse:

-Consegui porque sou bom, escrevo muito bem e me dediquei muito

Logo o menino foi chamado de arrogante e egocêntrico.

Engraçado –Pensou a garota- Os amigos no mínimo queriam que o garoto dissesse que foi pura sorte ou obra do acaso. Qual será o motivo que leva as pessoas a quererem acreditar em mentiras?A garota pensou bem e sussurrou:

–Medíocres.

No mesmo dia ela constatou a segunda coisa:

A maioria das pessoas ama mais os outros que a si mesmos, o exemplo para essa constatação chegou assim que o garoto voltou para casa com sua redação, e sem amigos.

Um garoto, parado no banco central da praça olhava, desesperadamente, para o relógio. Parecia contar cada passo do ponteiro e quando, finalmente, olhou para a sua frente achou o motivo da angustia na espera. Uma garota, aparentemente normal, sentou ao seu lado e falou algo que o deixou: Confuso,magoado e arrasado. Assim que ela saiu do seu campo de visão o garoto se derramou em lágrimas, e a observadora ,que se escondia nos arbustos, ficou tão comovida que foi ao seu encontro para perguntar se estava tudo bem

Mesmo sem a ter visto uma única vez ele abriu seu coração, dizendo:

-O que tem de errado comigo? Ela era a pessoa perfeita e eu estraguei tudo, eu deveria ter sido um namorado melhor, ter passado mais tempo com ela, ter comprado aquele colar que ela me pediu…

A observadora se levantou e ia voltando para o seu banco azul, mas antes disse a ele:

-Você só vai amar realmente alguém quando aprender a amar você mesmo.

Quando se viu novamente no banco ela sussurrou:

-Baixa auto-estima

Nos dias seguintes ela viu pessoas agindo normalmente, bem agindo da maneira que a maioria dos seres humanos age, mas duas semanas depois ela notou algo a mais:

Terceira coisa: A maioria das pessoas não suporta a idéia de ficar sozinhas

Era evidente, ninguém ia para a praça para ficar só, parecia que a maioria tinha medo de conhecer a si mesmo, como se fosse algo de gente maluca, e que todos precisassem sempre de alguém ao seu lado: Pra ela não era assim

Foi quando ela virou para o a frente do banco e sussurrou:

-Medo

Foi nesse momento que alguém sentou ao seu lado, isso nunca tinha acontecido antes ,e lhe abriu um grande sorriso dizendo:

-Você não precisa ter medo, eu estou aqui e posso te ajudar

Ela o olhou nos olhos, preparada para dar sua pior resposta, mas não conseguiu, os olhos dele eram de uma verdade comovente.

-Eu não estou com medo, é que eu venho todos os dias e sento nesse banco para observar as pessoas…

Ele parecia muito interessado quando a perguntou:

-E faz parte do seu plano ficar falando sozinha?

-Não, eu apenas digo as minhas conclusões rápidas sobre o que eu vejo

-Hmmmm, e o que você já disse?

-Medíocres, Baixa auto-estima e medo.

-Você está se referindo a todos então

-Não acho que seja assim

-Sério? Eu me enquadro em todas essas palavras, você não?

-Não! Bem…Sim, não sei, nunca parei para me observar

-E qual seria o motivo?

-Eu sempre estive do lado de fora.

Bolha



Já era noite, mais uma noite em claro. Dormir era impossível, pelo menos para ela, pensar no que fizera não a deixava, ao menos, fechar os olhos por mais de três segundos.

Ninguém sabe, ao certo, o que acontecera com ela, afinal todos pareciam querer viver ao seu lado, sentir o seu sucesso e ver sua simplicidade .Só se sabe que desde que ele fora embora ela se trancara no quarto e de lá não saíra, a noite se ouve o choro e os resmungos, de dia as fotos sendo rasgadas e as cartas sendo amassadas repetidas vezes.

Alguns dizem que ele disse que a amava, mas precisava ser melhor para pode ficar ao seu lado.Era sempre assim: Ninguém nunca fora bom o suficiente para amá-la, deveria ser uma responsabilidade enorme ser o par de alguém perfeito.

Luiza está trancada no seu quarto, pensando em tudo que poderia ter feito-e não fez, a única coisa de que se lembra é do ultimo encontro com o seu verdadeiro amor:

-Estava com saudades (…)

-Preciso lhe contar algo

-O que?

-Fui pego

-Pego? Como assim?

-O amor me pegou

-Então também fui pega por ele

-Mas, não é assim. Eu não posso te amar

-Por quê?

-Porque o seu amor é forte e o meu é uma bolha, um toque seu e ele estoura.

E ele se foi, pra nunca mais voltar.